segunda-feira, 1 de junho de 2009

Para refletir: Nossos índios

Para iniciar a semana, publicamos o artigo da colega Ouvidora de Maracanaú, e membro do Fórum Cearense de Ouvidorias, Edna Martiniano, sobre um tema deveras interessante. Vale a leitura.

Nossos índios

Qual é a imagem que nós temos cristalizada no nosso imaginário a respeito dos nossos índios?

Esse é um momento oportuno para que possamos fazer uma reflexão sobre a nossa diversidade étnica e cultural, quando presenciamos a participação ativa das lideranças, comunidades e organizações indígenas e percebemos que o dia dedicado a eles há muito deixou aquele caráter folclórico e tornou-se um momento em que eles próprios são os protagonistas e não apenas povos arbitrariamente condenados ao desaparecimento.

Achamos que todos os indígenas são iguais. Aprendemos na escola e nos livros didáticos. Um engano cometido por Cristóvão Colombo, em 1492, quando aportou na América e denominou todos os habitantes de índios, pensando ter chegado à região das Índias, continua sendo praticado por nós, apesar de ter se passado um longo tempo.

Na verdade, existem mais de 200 etnias diferentes no Brasil, cada uma com sua denominação, sua história, sua cultura e seu modo de viver, que dependem muito do local onde vivem e da intensidade do contato que tiveram com outros povos. Somente no Ceará, temos conhecimento da existência dos Tremembé, Tapeba, Pitaguary, Jenipapo-Kanindé, Tabajara, Calabaça, Potiguara, Kanindé, Tupinambá, Cariri, Paiacu e Anacés. São homens e mulheres, velhos, jovens e crianças como nós, mas que são vistos de forma estereotipada: "descaracterizados", "sobreviventes", "remanescentes", "descendentes", "que perderam suas memórias", "perderam suas identidades", como se só o que faziam no passado é cultura, como se cultura fosse uma coisa estática, imóvel, fixa, que não varia e que permanece inalterável. A cultura não é inata, mas se adquire, se cria e se aprimora, ela é, portanto, dinâmica.

Trata-se de um discurso notadamente negativo e pessimista, que revela um conceito distorcido que muitos têm sobre os nossos índios de que eles são pobres, miseráveis, dignos de compaixão, que estão fadados ao desaparecimento e são vistos como peças de um passado indígena que se perdeu no tempo e que são incapazes de se defenderem e de se organizarem. Todas essas construções revelam grande significação simbólica e remetem a imagens extremamente ligadas aos valores da cultura do povo cearense.

O que os nossos índios cearenses são, hoje, é resultado da sua história de vida, uma história marcada pela conquista e pela perda de seus territórios, pela escravidão, pela fuga, pelo falso desaparecimento, pelo silêncio, pela resistência e pela coragem de reivindicarem e de anunciarem para toda a sociedade que sempre existiram e que nunca vão desaparecer, porque cultura não se perde mas adquire novas funções.

EDNA MARTINIANO
Socióloga
Pesquisadora dos Povos Indígenas no Ceará